Existem relatos de casos de castração, eunucoidismo e
transexualidade desde a mitologia greco-romana, visto o caso do adivinho
Tirésias que ao ver duas cobras copulando no cume de uma montanha as separa e
mata a fêmea, assim sendo, ele é punido pelos Deuses, sendo transformado em uma
mulher. Sete anos depois, já adaptado a essa condição, ele novamente sobe o
monte e encontra duas cobras copulando, dessa vez ele as separa e mata o macho,
e com isso consegue reaver sua forma masculina.
Por conta de ter experimentado tanto o prazer
masculino, quanto o prazer feminino, Tirésias é escolhido como juiz numa
disputa entre Zeus e Hera em relação a esse tema.
Tirésias diz que o prazer da mulher é muito superior
ao prazer do homem, porém Hera o cega ao compreender que este prazer depende do
desempenho do homem.
Zeus condoído, lhe da o dom da adivinhação como forma
de “ver o futuro”. Esse dom vai desempenhar um papel especial em outros mitos,
como o de Édipo, por exemplo. (BRANDÃO, 1997, apud SADEEH, 2004, p. 12)
Os gregos possuíam um Deus chamado Hermafrodita, que
era o patrono da união sexual, este possuía mamas como uma mulher e pênis como
um homem, se assemelhava bastante ao travesti dos tempos atuais. (SADEEH, 2004)
Vários países e culturas do mundo têm sua forma
específica de designar determinados subgrupos de transexuais. Na Índia existem
as “Hijras” que foram designadas como homens no nascimento e mais tarde
passaram a viver como mulheres. Na Tailândia o termo “Kathoey” é utilizado de
forma semelhante a transgênero. Em muitos países ocidentais utiliza-se habitualmente
a palavra travesti para identificar pessoas transexuais. (WIKIPEDIA,
2007a,b)
Em relação as “Hijras”, elas são aceitas
culturalmente, desde há muito tempo. (Cohen, 1995) e segundo Money, 1988 as
“Hijras” podem pertencer tanto a uma casta quanto a um culto. Possuem uma deusa
própria, Bahuchara Mata, e pela medicina ocidental podem ser considerados
transexuais masculinos.(Cardoso, 2005)
Na Tailândia foi realizado um estudo muito
interessante sobre as tradicionais travestis tailandesas, as “Kathoey”, foram
entrevistadas, 165 “Kathoeys” com idade media de 25 anos. O estudo mostra que
por volta dos 10 anos, 71% deles já se sentiam diferentes dos outros meninos,
42% sentiam que tinham uma mente feminina ou “Kathoey” e 35% já se percebiam
exatamente como se percebem hoje. Interessante apontar que somente 7% assumiu
ter experimentado algum sentimento sexual nessa fase e que apenas 2% afirmou
ter tido alguma experiência sexual. (CARDOSO, 2005)
Com a entrada na adolescência, estes indivíduos,
começaram a se perceber mais como mulheres ou um terceiro gênero e a maioria
percebeu ou desenvolveu uma preferência sexual, consistente com sua nova
identidade sexual, ou seja, atração sexual por homens e desejo de serem
penetrados. (CARDOSO, 2005)
Carl Heinrich Ulrichs (1862-1995), era um advogado,
homossexual, que propôs a teoria de que os homossexuais não seriam nem
criminosos nem insanos, mas sim, “almas de mulheres aprisionadas em corpos de
homens”, resultado de um erro na diferenciação embrionária. (SADEEH, 2004).
Muitos transexuais baseiam-se nesta teoria para tentar justificar a sua
condição diferenciada.
Com um pensamento muito semelhante Costa (1994) coloca
que o transexualismo seria uma extrema inadequação da identidade de gênero,
resultando em grande sofrimento sentindo sua alma feminina aprisionada num
corpo masculino (MtF) ou o contrário no caso do FtM, onde a alma masculina
estaria presa num corpo de mulher.
No Brasil, a figura do travesti apresenta características
distintas das descritas por pesquisadores americanos e europeus, cabe destacar
que o travesti masculino, mesmo se submetendo a tratamento hormonal, deixando
os cabelos crescerem, realizando cirurgia para a implantação de silicone
criando mamas semelhantes à de mulheres, mesmo esteticamente em muito se
aproximando do visual feminino, ainda assim, o verdadeiro travesti não nega sua
genitália masculina. (OLIVEIRA, 2001)
Referente a genitália, o travesti à aceita como algo que o
torna uma mulher diferente e parte do fetiche, além de muitas vezes ser a
questão principal no relacionamento, já o transexual nega a sua genitália, não
suporta e não gosta de ver, tocar ou ser tocado. O travesti não se sente
acanhado de tocar, ver ou ser tocado em sua genitália. Para o travesti, sua
genitália faz parte do modo como obtém seu prazer sexual. O transexual não
admite obter prazer com sua genitália, seja em nível de masturbação ou com o
envolvimento de outras pessoas. (OLIVEIRA, 2001)
Antigamente o travesti se restringia unicamente a alterações
de vestuário e cosméticas no corpo, atualmente, em nossa cultura, mesmo o
emprego de hormônios e aplicação localizada de silicone (muitas vezes silicone
industrial) podem estar presentes enquanto variações que, não classifiquem por
si sós o sujeito como um transexual. Existe a necessidade de clarificar as
diferenças entre os transexuais e os travestis, uma vez que existe a
necessidade de um olhar diferenciado no cuidado com estas pessoas, baseado no
contexto cultural e social em que estão inseridos. (OLIVEIRA, 2001)
Em 2006 foi publicado na revista “Estudos Feministas” de Florianópolis um
trabalho com um olhar apontado especificamente para o travesti brasileiro,
Larissa Pelúcio, traz que as travestis são pessoas que nascem com o sexo
genital masculino (por isso a grande maioria se entende como homem) e que
procuram inserir em seus corpos símbolos, do que se remete socialmente ao
feminino, sem, contudo, desejarem extirpar a genitália, com a qual, geralmente,
convivem sem grandes conflitos.
Ainda
nesse trabalho a autora comenta que “Não basta se vestir de mulher para ser travesti”.
Assim como comenta Claudinha Delavatti, travesti já falecida, entrevistada pela
autora: “travesti que não toma hormônio não é travesti, pensa que é carnaval e
sai fantasiado de mulher”.
Hélio
Silva, num trabalho etnográfico sobre as travestis da Lapa, cita a fala de uma
delas que diz que, além dos hormônios, é preciso que se façam aplicações de silicone
a fim de dar forma feminina ao corpo. Para as travestis, além dessas
intervenções e da apreensão de uma série de técnicas corporais que as distancia
dos padrões masculinos, buscam agir, em muitos momentos, segundo prescrições de
comportamentos instituídos como femininos, sem esquecerem, em contextos
específicos, que dentro delas “mora um rapaz”, expressão habitual no meio. (1993, apud Pelúcio, 2006)
Um outro ponto de interesse que se apresenta e que deve ser levado em
consideração é a pergunta: Quem é o parceiro do transexual e da travesti?
Em 1993 dois pesquisadores, BLACHARD e COLLINS realizaram um estudo a respeito
de homens que se interessavam por travestis, transexuais e homens feminilizados.
A esse desejo eles dão o nome de ginandromorfofilia e concluem que essa população
é bem maior do que se imagina. (SAADEH, 2004)
Em relação ao transexual, é fundamental destacar a dor e o sofrimento de
sentir-se preso a um corpo e situação social não condizente com seu estado
emocional. O transexualismo está relacionado aos sentimentos e desejos internos
de adequar-se fisicamente ao que se é psicologicamente, diferentemente do
travesti brasileiro que em muitas situações, visa obter lucros com a absorção
de símbolos do gênero oposto, o transexual busca a troca de sexo, a fim de
encontrar a integridade física e emocional, na medida em que o indivíduo
comporta-se e sente-se de fato como se fosse uma mulher em um corpo de homem ou
um homem em um corpo de mulher. (OLIVEIRA, 2001; CARDOSO, 2005)
O transexual apresenta um distúrbio de identidade de gênero, constante e
persistente, que evolui na busca da mudança permanente de seu sexo, passando pelo
vestir-se e comportar-se de acordo com o outro sexo, dando seqüência a um
tratamento hormonal e culminando em uma cirurgia de redesignação sexual, a não
ser que, apesar do enorme desejo neste sentido, o indivíduo se veja impedido
por fatores outros e que necessitam de uma solução antes da mudança definitiva
de sexo. Tais fatores impeditivos podem estar relacionados à falta de dinheiro
para custear o tratamento, conflitos morais ou religiosos, problemas oriundos
do fundo sócio-cultural, político, legal e religioso no qual o indivíduo está
historicamente inserido.
Harry Benjamim em 1952 foi um dos primeiros a usar o termo transexualism
(transexualismo), que na época competia com outros termos como,
transexists ou inversion e durante muito tempo, foi discutida a
diferença entre os transexuais e os travestis; cabe destacar que eles podem ser
considerados fenômenos diferentes, mas que também podem ser percebidos como
sintomas ou graduações do conflito de gênero, em que os travestis teriam um
comprometimento menor e mais recorrente na questão da prevalência, por outro
lado, no caso do fenômeno transexual, haveria um comprometimento maior e mais
profundo, porém com uma prevalência bem menor (BENJAMIM, 1966)
Esta questão nos coloca mais uma vez frente à necessidade de um bom
diagnóstico para poder trabalhar de forma correta o indivíduo, pois um travesti
nem sempre quer perder sua capacidade de ejacular, como um individuo do gênero
masculino, além do que em muitos casos esse é o diferencial na relação ou até
mesmo o que dá o sustento para algumas travestis que se prostituem,
diferentemente de um transexual que ao ser tocado em sua região genital ou nos
seios no caso de um transexual masculino, sentiria-se rebaixado ou incompleto.
Referencias:
BENJAMIN, Harry (1999). The transsexual phenomenon. [Electronic
Edition]. Dusseldorf: Symposium. Retrieved June 18, 2005 from: http://www.symposion.com/ijt/benjamin/index.htm.
Originalmente publicado como Benjamin, Harry. The transsexual
phenomenon. New York: Julian Press, 1966.
CARDOSO, Fernando
Luiz. Inversões doPapel de Gênero:”Drag Queens”, Travestismo e
transexualismo. Psicologia Reflexão e Crítica, 2005, 18(3), pp 421-430
COSTA,
Ronaldo Pamplona da. Os 11 sexos: As múltiplas faces da sexualidade humana.
3º ed., São Paulo: Editora Gente, 1994.
OLIVEIRA, Silvério da Costa. O psicólogo clínico e o problema
da transexualidade. Revista SEFLU. Rio de Janeiro: Faculdade de Ciências
Médicas e Paramédicas Fluminense, ano 1, nº 2, dezembro 2001.
PELÚCIO, Larissa. Três
casamentos e algumas reflexões: notas sobre conjugalidade envolvendo travestis
que se prostituem. Estudos Feministas, Florianópolis, 14(2): 248,
maio-agosto/2006
SAADEH, Alexandre
Transtorno de identidade sexual: Um estudo
psicopatológico de transexualismo feminino e masculino; São Paulo – 2004
WIKIPÉDIA. Desenvolvido pela Wikimedia Foundation.
Apresenta conteúdo enciclopédico. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Transexualidade&oldid=6929192>.
Acesso em: 20 Ago 2007c
Texto esclarecedor e maravilhoso! O melhor foi citar as referências... importantíssimo para quem interessa-se pelo assunto! Parabéns!
ResponderExcluirObrigado, é bom receber este tipo de incentivo nos primeiros textos.
ExcluirAbraços
Pedro Lima
Um texto muito esclarecedor. Estou fazendo tcc e o tema é sobre homens trans, citar as referências é fundamental. Parabéns!
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